Lei da Igualdade Salarial um Estímulo Eficaz

Leia a materia originalmente na Edição 165 da revista Gestão RH

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Historicamente, as mulheres lutam por reconhecimento e igualdade de condições no trabalho, enfrentando disparidades salariais e limitação de oportunidades. Isso se dá em um panorama global no qual, ainda que possuam a mesma capacidade e capacitação que os homens, frequentemente recebem remunerações menores pelo mesmo trabalho.

A Lei nº 14.611, que versa sobre a obrigatoriedade de igualdade salarial e critérios remuneratórios entre mulheres e homens, surge como um marco legislativo crucial. Sua promulgação em 3 de julho de 2023 não é apenas um avanço contra a discriminação de gênero, mas um impulso fundamental para o desenvolvimento socioeconômico, promovendo justiça e equidade no coração das relações trabalhistas e abrindo portas para que o mesmo aconteça nos demais grupos minorizados.

Depois dessa lei, no mesmo ano, vieram o Decreto nº 11.795 e a Portaria nº 3.714, que detalham os critérios e formatos de comparação e equiparação, tais como a utilização da Classificação Brasileira de Ocupações (CBO) e dos dados do eSocial, além de estabelecer o prazo de 90 dias para apresentação dos planos de ação após possíveis inconsistências e notificações.

A lei determina que o governo deve disponibilizar canais para denúncias de discriminação salarial, que as empresas adotem mecanismos de transparência salarial e de critérios remuneratórios, além de promover programas de diversidade e capacitação de gestores, lideranças e colaboradores, e fomentar capacitação e formação de mulheres, estimulando que elas ingressem, permaneçam e cresçam em suas carreiras em igualdade de condições com os homens.

Para estarem aderentes à lei, empresas com 100 ou mais funcionários devem publicar relatórios semestrais, anonimizando dados e informações, conforme a LGPD (Lei Geral de Proteção de Dados). O governo, além de disponibilizar plataforma, ferramentas e relatórios com informações do eSocial, é responsável por fiscalizar possíveis discriminações salariais.

Todas as empresas deveriam atualizar seus cadastros no Portal Emprega Brasil e responder ao questionário solicitado até 8 de março de 2024 e, até 31 de março, publicar o primeiro relatório. O descumprimento resulta em multa de 3% da folha salarial, limitada a 100 salários-mínimos. A cada seis meses, ou seja, em setembro, haverá a obrigatoriedade de nova publicação, e assim consecutivamente. O que podemos e devemos fazer até lá?

Se sua empresa ainda não publicou o relatório, faça-o imediatamente, para evitar multas e sanções, ou consulte seu escritório de advocacia. Se já publicou, além de analisar o relatório governamental, é importante criar o seu próprio relatório, considerando as especificidades do seu mercado, carreira, cargos, tempo de empresa, grades e critérios de avaliação de desempenho.

Ao fazer seu próprio relatório, a empresa terá uma visão mais detalhada e assertiva de seus dados, identif icando pontos críticos. Gaps podem existir por diversos motivos: em verticais de carreira diferentes, na proporcionalidade entre homens e mulheres e mesmo devido aos agrupamentos feitos em função da utilização de CBOs, que nem sempre são comparáveis com os cargos adotados.

É comum que remunerações fixas sejam equiparadas e que especialmente variáveis e participações em comissões e lucros apresentem diferenças significativas. Sendo assim, é importante entender o que vem sendo feito e por que as mulheres não conseguem se desenvolver em suas remunerações variáveis, em verticais específicas e os eventuais limitadores de progressão de carreira.

Independentemente de onde está a fragilidade, a empresa só a identifica quando reúne seus dados, muitas vezes dispersos em diferentes sistemas e planilhas. Ao conhecer seus números e a história de sua empresa, como o número de mulheres contratadas mensalmente ou anualmente, quantas são demitidas, quantas são Alexandra D’Azevedo Nunes é diretora de Gente e rH da Peers Consulting & technology DivULGaçãO/PEErs promovidas, analisando o cargo, nível de carreira, em comparação com homens, há a chance de entender a realidade da sua empresa e como ela se comporta.

Com a publicação semestral de relatórios, será possível acompanhar a evolução e identificar quais empresas estão progredindo e quais não estão contribuindo para uma sociedade mais justa e igualitária. Trazendo em metáfora, o primeiro relatório é como uma foto da realidade momentânea da empresa, mas, com o passar do tempo, haverá um filme de sua evolução.

O primeiro relatório indicou que a desigualdade salarial e de critérios remuneratórios entre mulheres e homens está em 19% das organizações. Como cidadãos, é nosso dever atuar em uma transformação significativa, reconhecendo essa disparidade e tomando ações concretas, como grupos de mentoria para mulheres e minorias, revisão e avaliação de critérios de desempenho para reduzir vieses, treinamentos específicos para líderes e gestores e o desenvolvimento de programas de apoio às mulheres, como licença-maternidade estendida e auxílio àquelas que tem filhos.

A nova lei nos provoca: como nossos grupos de afinidade podem preparar, desenvolver e mobilizar pessoas para promoções? Como acompanhar as carreiras e entender seus desafios, agindo de forma direta e pragmática para apoiá-las e reconhecê-las?

Esse momento histórico destaca a importância da igualdade, tanto por vocação quanto pelo reforço das autoridades, configurando um estímulo eficaz para a construção de uma sociedade mais justa e igualitária.