A experiência do cliente como alavanca nos negócios para resultados acima da média
Por Luca Fraga*
Se você tivesse apenas um critério de análise para escolher as empresas que iriam compor sua carteira de investimentos, qual seria? Fred Reichheld, criador do NPS, escolheu analisar apenas uma métrica: a nota que os clientes dão em relação à satisfação e fidelização.
Como resultado, sua carteira superou em 510% a rentabilidade no mercado americano, comparando com a taxa total de retorno (TSR, na sigla em inglês) num período de 10 anos de análise. O estudo está detalhado no novo livro de Reichheld, intitulado “Vencendo com Propósito”
Mas o que de fato se revela? De forma objetiva e com evidências, o estudo mostra que colocar a necessidade dos clientes à frente em todas as interações, não é “só” bom para as pessoas, mas também é excelente para os negócios.
A lógica é simples – clientes encantados com a experiência proporcionada gastam mais, compram mais vezes e ainda fazem propagando ‘boca a boca’ positivo, trazendo novos clientes a custo zero (ou custo negativo, uma vez que a empresa lucrou com a venda e ainda recebeu uma indicação).
Além disso, esse tipo de abordagem prepara melhor a empresa para os desafios de longo prazo em um ambiente de negócios em constante mudança. Ou seja, estar conectado com o que os clientes realmente querem e precisam proporciona mais dinamismo, flexibilidade, resiliência e capacidade de inovação perante as evoluções nos padrões de consumo.
Customer Experience: a abordagem para chegar lá
Para atingir tais resultados, muitas das empresas citadas no estudo (Amazon, Apple, Nike, Google, Meta, Verizon e também algumas nacionais, como Nubank) entenderam que a centralidade no cliente é um exercício contínuo. Hoje, a principal disciplina de negócios, que consolida o conjunto de ações para essa finalidade, é a chamada Customer Experience.
A expressão em inglês para Experiência do Cliente é conhecida pela sigla CX e seu significado é resultado da percepção acumulada do consumidor, baseada em suas memórias e interações com todos os pontos de contato da jornada. No entanto, trilhar este caminho de excelência na experiência não é fácil.
Cada negócio possui seu próprio nível de maturidade atual de CX e está inserido em um mercado com especificidades e níveis de exigência diferentes. Para uma verdadeira Transformação da Experiência do Cliente, podem-se considerar os seguintes pilares:
Customer Analytics: entenda seus clientes e suas necessidades
O primeiro pilar trata de ouvir, observar e aprender mais sobre o comportamento dos clientes, seja ele expresso (ex: pesquisas de opinião, pesquisa de mercado, personas) ou efetivamente praticado (ex.: análise dos dados de compra e uso; prática de cliente oculto). Esse é o passo fundamental que irá apontar onde estão as dores, a atenção e a disposição de despender dinheiro do seu público-alvo. Errar aqui pode significar errar na rota a ser adotada a seguir.
Estratégia de CX: alinhe expectativas do cliente com a ambição interna
Em seguida, olha-se para dentro de casa, fazendo uma análise dos processos que entregam (ou deveriam entregar) soluções para as dores dos clientes. Nesse momento, será possível ter uma visão do tamanho da lacuna (se seus clientes esperam mais autonomia e digitalização no processo de atendimento, e você só oferece o telefone e caixa de e-mail padrão, isso certamente corrompe a experiência) e tomar a decisão de como a empresa quer se posicionar. Em alguns casos, pode envolver abandonar determinados mercados ou reduzir o tamanho do portfólio para direcionar investimentos em atividades de maior valor agregado aos consumidores.
Melhoria das Jornadas do Cliente: onde a experiência de fato é entregue
No terceiro passo, mãos à obra. É hora de revisitar aqueles processos que não entregam a experiência esperada e redesenhá-los. Pode ser necessário envolver tecnologia, mudança de processos, capacitação das pessoas e até revisão de questões jurídicas. Nessa fase, o crucial é um bom sistema de ponderação e priorização do que deve ser feito, pois é comum que as iniciativas se multipliquem e disputem os mesmos recursos financeiros, humanos e de tempo. É aqui que a formação de uma equipe dedicada de CX ou a contratação de uma consultoria dará a coerência, ritmo e assertividade para as diferentes frentes de trabalho envolvidas nessa melhora da experiência do cliente;
Indicadores e métricas: o que não se mede não se gerencia
Para balizar os avanços e acompanhar o resultado das ações, entra o quarto componente dessa estratégia – os indicadores. Eles precisam cobrir dois principais aspectos: medir o resultado direto das ações (melhora na nota de satisfação, aumento das avaliações positivas em sites), mas também o impacto dessas melhoras no resultado do negócio (ex.: 70% dos clientes que avaliaram melhor o NPS aumentaram o ticket médio entre as duas medições). As métricas de CX mais usadas são o NPS (de 0 a 10 quanto recomenda a empresa), o CSAT (de 1 a 5 que nota dá para o atendimento) e a própria taxa de reclamações sobre a base total de clientes. Diversos outros KPI podem ser usados, de acordo com cada contexto;
Governança e escalabilidade organizacional: acompanhe, incentive e dissemine
Para que os esforços não fiquem isolados, concentrados na área de CX (afinal, mudar a jornada pode envolver do marketing ao jurídico), adote práticas como o Comitê de Clientes, onde as lideranças acompanham os indicadores e casos relacionados à CX; inclua um programa de Voz do Cliente (VoC), trazendo a opinião direta dos consumidores sobre os produtos e serviços ofertados e implique a alta liderança na jornada – a recomendação é que todo o c-level tenha metas de remuneração associadas, ao menos em parte, a métricas de CX, já que isso reforça o esforço conjunto na melhoria da experiência;
Planeje bem o suporte e atendimento, imprevistos acontecem
Mesmo que a estratégia esteja alinhada com as necessidades dos clientes e a jornada revisada, algo pode dar errado. Nesses momentos, o pico de emoção na relação com a marca é atingido. A forma como a empresa irá lidar com essa demanda pode determinar o soterramento derradeiro da imagem perante a concorrência ou reverter o problema em uma oportunidade de encantamento com altas chances de fidelizar. Capacitação, remuneração e incentivos para os atendentes e demais colaboradores na linha de frente são fatores chave de sucesso.
Resultados: CX precisa falar a linguagem dos negócios
Ao longo de toda essa jornada, o programa de CX pode ser questionado. Para conquistar a confiança e os recursos necessários, é preciso mostrar valor tangível. Este nem sempre será o fator decisivo único, mas ignorá-lo é colocar em risco uma estratégia baseada apenas em benefícios intangíveis. Para ajudar neste exercício, alguns exemplos que rendem bons business cases:
- Retirar atritos no processo de finalização da compra, como check-out mais autônomo e com ampla diversidade de meios de pagamento, pode melhorar a conversão, ticket médio e até recorrência de compra. Isso traz impacto direto na receita;
- Outra forma é contar com a empolgação dos seus melhores clientes (promotores e fãs) para convidar amigos (novos clientes). Essa ação reduz seu custo de aquisição de clientes, ou CAC;
- Na linha de custos, meça o custo de dar suporte às falhas de processo e a economia a ser gerada se corrigido. Um sistema inconstante que dificulta a consulta de fatura e saldos, por exemplo, leva um grande número de reclamações ao atendimento. A conta sobre investir em uma tecnologia melhor deve considerar a redução no custo de atender estas ligações.
- Muitas vezes é preciso mostrar valor antes de obter os recursos totais necessários. Nestes casos, isole uma amostragem e meça em menor escala um processo pensado na experiência contra o processo atual e projete os ganhos.
Gerir de forma efetiva a experiência do cliente não é tarefa fácil. Se fosse, todas as empresas seriam uma Apple. Esse exercício contínuo requer empenho e profundo interesse pelas pessoas que mantêm o negócio de pé, os clientes.
Aos profissionais da área de CX e afins: conheçam as métricas e indicadores de resultado usados em sua companhia e desenhem táticas de ganho rápido para que a CX ajude a atingi-las. Aos CEOs e c-level: cobrem assertividade das iniciativas, mas apoiem-nas e confiem no retorno de médio/longo prazo. Ele virá, juntamente com um forte diferencial competitivo difícil de copiar. Os casos de sucessos no Brasil e lá fora comprovam isso.
*Luca Fraga é associado na Peers Consulting há 2 anos. Atua como Team Leader em projetos de Experiência do Cliente, Atendimento, Agilidade e Melhoria de Processos em diversos setores como Óleo e Gás, Telecomunicações, Educação, Varejo e Saúde. Formado em Administração e pós-graduado em Gestão por Processos, ambos pelo Ibmec.
Voltar para todos os artigos