Benefícios financeiros com a melhoria do Nível de Serviço em Supply Chain

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Tempo de leitura 12 minutos

Categoria Supply Chain

Maneiras de gerar benefício em Supply Chain

Em diversas áreas de uma empresa, mas principalmente em Supply Chain, existem duas avenidas principais que são exploradas para buscar diferencial competitivo no mercado e alavancar o resultado: Redução de Custo e Melhoria do Nível de Serviço.

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A avenida de Redução de Custo é bastante tradicional e amplamente explorada pelas empresas. Tipicamente, o principal indicador é o famoso Custo Logístico, composto de:

  • Custo de Transporte: Custo de frete e/ou manutenção de operação própria para Inbound, Transferências e Outbound Middle, e Last Mile. Os valores variam de 1% a 10% da ROL de modo geral, dependendo da indústria. Projetos de malha, roteirização, control tower, revisão de modal de carga, make vs buy, otimização de tempos de carga, descarga e espera são os mais comuns para redução destes custos; 
  • Custo de Armazenagem: Custos fixos (ex: Depreciação, Aluguel, Facilities e Overhead) e variáveis (ex: Equipe operacional, Equipamentos de movimentação, serviços específicos) de operação de Centros de Distribuição, Hubs e Transit Points. Os valores variam de 1% a 4% da ROL de modo geral, dependendo da indústria. Projetos de malha, eficiência de armazém incluindo elementos de automação e WMS são os mais comuns para redução destes custos.

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Algumas empresas também trabalham outros elementos além dos citados anteriormente:

  • Custo de Estoque: Custos de oportunidade de capital e perdas tipicamente. Os valores acima variam de 1% a 4% da ROL. Projetos de previsão de demanda, otimização de modelos de abastecimento e estoque, Planejamento de Vendas e Operações (S&OP,) e prevenção de perdas são os mais comuns para redução destes custos;
  • Custo da Mercadoria Vendida: Custo de insumos e custos de fabricação. Os valores acima variam de 40% a 80% da ROL. Este último elemento normalmente é bastante trabalhado por equipes de Pesquisas e Desenvolvimento, Compras e Manufatura. Strategic Sourcing, Make vs Buy, Design to Manufacturing, Manufacturing Excellence, Advanced Manufacturing, Production Planning são alguns dos projetos mais comuns para redução destes custos.

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A avenida de Melhoria do Nível de Serviço, apesar de importante e amplamente monitorada pelas empresas, raramente tem uma tratativa de financeirização tão forte e direta quanto a avenida de Redução de Custo. Aqui, existe um indicador mais comum medido para varejo e outro para indústria.

  • Ruptura (para varejo): Falta de disponibilidade do produto no ponto de venda. Existem variações e subdivisões deste indicador no mercado, tais como: Ruptura Comercial, Ruptura Operacional, Índice de Desabastecimento; 
  • OTIF (para indústria): Produto entregue no prazo e completo para o cliente. Existem algumas variações mais simples e mais completas deste indicador no mercado, tais como: Fill Rate, On Time Delivery (OTD), Pedido Perfeito e eventualmente NPS e/ou pesquisas específicas; 
  • Frequência/Prazo de atendimento (para indústria): Com que frequência o cliente pode fazer o pedido (diário, três vezes por semana, semanal, quinzenal) e quanto tempo leva para o atendimento do pedido (lead time total da colocação do pedido até a disponibilização no local acordado com o cliente). 

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O que é bastante interessante e curioso é que muitos dos principais projetos para melhoria de nível de serviço são os mesmos de redução de custos, porém com outra ótica. Os mais comuns: projetos de previsão de demanda, otimização de modelos de abastecimento e estoque, S&OP e prevenção de perdas, malha, roteirização, otimização de tempos de carga, descarga e espera e eficiência de armazém e Order to Cash. 

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Porque gerar benefício via melhoria de NS é importante 

Uma vez que a maioria dos projetos que podem reduzir custos ou melhorar o nível de serviço são os mesmos, é muito importante decidir qual será o viés do projeto: Custo ou Nível de Serviço.  

Como muitas vezes o benefício financeiro da melhoria do nível não é claro e direto, é muito comum que as empresas optem pelo viés da redução de custos. Diante disso, empresas que se empenham em financeirizar os benefícios dos projetos de melhoria de serviço podem conseguir resultados melhores e se diferenciar perante os competidores de mercado por meio da melhor alocação dos recursos da empresa. 

Mas aí pode surgir a pergunta: como financeirizar estes benefícios? Existem diversos trabalhos acadêmicos sobre o tema, mas, na minha experiência prática de mais de 20 anos conduzindo projetos em Supply Chain, há poucos casos relatados. Na minha visão, isso ocorre principalmente por conta da complexidade dos mecanismos de medição propostos pelos trabalhos acadêmicos. Assim, neste artigo será compartilhado uma alternativa que irá privilegiar mais o aspecto prático do que o rigor metodológico. 

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Financeirização da Ruptura (Varejo): 

Ruptura significa falta de disponibilidade do produto para compra do consumidor. E cada dia sem o produto disponível para venda, de maneira prática, significa um dia de venda perdida. E a cada dia de venda perdida, o varejista deixa de capturar um dia de Lucro Bruto daquele SKU. Aqui já notamos a diferença que a ruptura de uma garrafa de água é diferente da ruptura de uma garrafa de uísque, pois os Lucros Brutos de cada SKU são bastante diferentes. Muitos varejistas não fazem este primeiro nível de ponderação. 

Neste instante, pode surgir o questionamento: mas se o consumidor substituir o produto por outro? Ou for em outro supermercado da mesma rede? Mas se aquele item for fundamental e ele deixar de fazer toda sua compra por conta daquele em específico? E se for um item de impulso? E se isto acontecer com certa frequência e o cliente deixar de comprar naquele supermercado para sempre ou por um longo tempo? E se isto gerar um stress na companhia e mobilizar ações de “urgência” tipicamente mais caras que o comum para prover a disponibilidade do produto o mais breve possível?

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Como deu para perceber, existem fatores que podem influenciar o impacto sobre a ruptura para mais ou para menos. Mas, de modo geral, o efeito “aumento” é bem mais comum. Por conta disto, varejistas mais maduros de classe mundial usam fatores de impacto de duas a quatro vezes o Lucro Bruto. 

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Dito isto, teríamos a seguinte equação de Ruptura Financeira para o Varejo:

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Exemplo ilustrativo: 

  • Garrafa de Água 
  • Dias de ruptura: 36 
  • Dias de venda: 360 
  • Venda média (ano): 10 milhões de unidades 
  • Lucro Bruto Médio: 2 R$ 
  • Fator de Impacto: 3 

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Para estágios iniciais, pode ser usado um Fator de Impacto para todos os itens em todas as localidades e para estágios mais avançados, este fator pode ser segmentado. 

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Financeirização do OTIF (para indústria): 

OTIF é a medição mais comum de nível de serviço para a indústria. Talvez seja uma métrica menos “ácida” que a Ruptura é para o varejo, pois a tolerância de um consumidor diante de uma ruptura no varejo tende a ser menor do que a tolerância de um varejista para um “não OTIF” diante da indústria que lhe fornece o item. Além disso, o varejista eventualmente conta com a “proteção de estoque” seja no seu centro de distribuição seja nos seus pontos de venda. Já o consumidor normalmente não possui “estoque”. 

Na teoria também existe o conceito do backorder, ou seja, aquele pedido não atendido pela indústria em um período pode ser adicionado em pedidos futuros. Contudo, na prática, ao fazer um novo pedido, varejistas mais maduros e atentos já consideram este backorder na sua “previsão de demanda”. E, se o índice de backorder for frequente, provavelmente a concorrência da indústria já absorveu parte da demanda, o histórico de vendas tende a cair e, com isto, as previsões para novos pedidos pelo varejista junto àquela indústria também caem. Em resumo, o backorder, na pior das hipóteses, tem um efeito nulo na recuperação do “Não OTIF” e, na melhor das hipóteses, recupera parcialmente a demanda. Também devemos considerar que, quanto maior for o tempo de atendimento do backorder, menor é o efeito na recuperação do “Não OTIF”. 

Assim como na Ruptura, existem aspectos que aumentam ou diminuem o impacto do “Não OTIF”. Embora menos comum, algumas indústrias de certa forma ponderam o Fator de Impacto no “Não OTIF”. Neste artigo, para efeitos de simplificação, consideramos um fator que varia de 1 a 2. Conforme falamos, isto se deve à maior tolerância do varejista (se comparado ao consumidor final), à presença de estoques e à possibilidade do backorder. 

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Dito isto, teríamos a seguinte equação de Financeirização de “Não OTIF” para a Indústria:

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Exemplo ilustrativo: 

  • Garrafa de Água 
  • Não OTIF: 5% 
  • Venda média (ano): 10 milhões de unidades 
  • Lucro Bruto Médio: 2,50 R$ 
  • Fator de Impacto: 1,5 

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Assim como no caso de Ruptura, para estágios iniciais, pode ser usado um Fator de Impacto para todos os itens em todas as localidades e para estágios mais avançados, este fator pode ser segmentado. 

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Financeirização da Frequência/Prazo de atendimento (para indústria): 

Este componente é raramente medido pela indústria dada sua complexidade de estimativa. Além disso, é um elemento de política, que uma vez definido, tende a não mudar no curto prazo. Por fim, o grau da mudança pode ser percebido de maneiras diferentes dependendo do segmento. Em termos práticos, se eu entrego em um dia a menos, ou se aumento a frequência de entrega de quinzenal para semanal, com certeza isto tem um efeito benéfico para o varejista. No mínimo isto traz menos necessidade de estoque para o varejista (menor estoque de ciclo) e menores índices de ruptura (pela maior responsividade à demanda), ou seja, otimização dupla. Contudo, é difícil estimar o quanto isto gera em “aumento de share” para a indústria, pois outros fatores mercadológicos fazem parte da equação (ex: preço, força da marca, itens substitutos, posicionamento do item). Aqui, o caminho mais prático para estimar o impacto é realizar uma pesquisa junto ao cliente varejista.  

Um aspecto importante aqui é que não é só o varejista que ganha com diminuição de tempo de atendimento e aumento de frequência de compras, a indústria também ganha pelos mesmos motivos, menor necessidade de estoque e menores “Não OTIFs” dada maior responsividade à demanda. Nestes casos, o melhor caminho para estimar o benefício é realizar simulações de atendimento e calcular eventuais contrapartidas de aumento de custo de frete, de pedido e, dependendo do caso, de fracionamento da produção. 

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Churn, uma alternativa de medição para indústrias 

Muito comum no segmento de serviços e para operações de e-commerce, o Churn é uma alternativa para as indústrias mensurarem a financeirização do nível de serviço.  

Churn, numa definição mais generalista, é uma métrica que indica o número da receita perdida por clientes que cancelaram uma relação comercial em determinado período. Após o cancelamento, é muito comum que áreas de customer service realizem uma pesquisa buscando identificar qual ou quais os principais motivos. 

Se a pesquisa for bem estruturada e conduzida, é possível avaliar qual a porcentagem (%) de motivos ligados a Supply Chain que levaram ao Churn. Tipicamente, existe uma alta correlação entre o indicador de OTIF e o % de Churn, classificado como Supply Chain. De tal forma que, através de um bom histórico, é possível traçar uma “correlação” de indicador OTIF e % de Churn ligado à Supply Chain.  

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Dito isto, teríamos a seguinte equação de Financeirização de Churn ligada à Supply Chain para a Indústria: 

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Exemplo ilustrativo: 

  • Churn: 10% 
  • % Motivos Supply Chain: 30% 
  • Lucro Bruto Médio: R$ 3.000 milhões (ou R$ 3 bilhões) 

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Conforme mencionado anteriormente, existe uma certa correlação de Churn SC e OTIF. Se melhorarmos o OTIF em 10%, é esperada uma redução em certa taxa de proporção. Contudo, para OTIFs mais altos (acima de 95%), a correlação tende a não ser mais linear. 

Esta medição tem um caráter mais estruturante e a longo prazo, pois foca na perda de resultado de relações de longo prazo, diferente das anteriores, que tem um foco mais operacional e tático. 

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Como colocar em prática 

Uma maneira bem interessante de colocar isto em prática é pensar em exemplos que podemos direcionar o benefício de uma ação com o viés de custo ou de serviço 

Vamos imaginar uma situação em que enxergamos a oportunidade de melhorar a produtividade de uma operação de armazenagem em um Centro de Distribuição em 10%. 

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Empresa: 

  • Indústria 
  • Faturamento: 10 bilhões R$/ano 
  • Lucro Bruto: 3 bilhões R$/ano 
  • Custo de Armazenagem: 200 milhões R$/ano 
  • Custo Variável de Armazenagem: 100 milhões R$/ano 
  • OTIF: 92% 
  • Fator de impacto: 1,5 
  • Churn: 10% 
  • % Motivos Supply Chain: 30% 

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 Aplicação 1: Redução de Custo:  

Redução do Custo variável do CD: 10% x 100 = R$ 10 milhões/ano 

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Aplicação 2: Melhoria do OTIF: 

Fazendo a operação 10% mais rápido posso escolher 

  1. Aplicar esta agilidade em entregar e menos tempo; 
  2. Entregar no mesmo tempo, mas tendo melhor desempenho em entregar como o prometido (melhor OTIF).
     

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Vamos supor que escolhemos a opção 2 

Custo do não OTIF: 8% x 3 bi x 1,5 = R$ 360 milhões 

Agora precisamos ver qual o impacto da melhoria da agilidade no OTIF. Isto depende de alguns fatores como, % de impacto do OTIF do CD no OTIF total e se os principais ofensores do OTIF CD são ligados à produtividade no CD. Diante disto, vamos supor três cenários aqui: 

  • Cenário 1: 10% mais rápido = aumento de 10% no OTIF 
  • Cenário 2: 10% mais rápido = aumento de 5% no OTIF 
  • Cenário 3: 10% mais rápido = aumento de 1% no OTIF 
  • Benefício cenário 1: 10% x 360 = R$ 36 milhões/ano 
  • Benefício cenário 2: 5% x 360 = R$ 18 milhões/ano 
  • Benefício cenário 3: 1% x 360 = R$ 3,6 milhões/ano  

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Diante destes cenários, aplicar o aumento da produtividade em melhoria de nível de serviço é melhor nos cenários 1 e 2, mas no cenário 3 é mais adequado aplicar em redução de custo. Mas, nos esquecemos de analisar sob a ótica de longo prazo, com a medição de Churn. Vamos imaginar apenas o cenário 3: 

Custo do Churn de SC: 10% x 30% x 3 bi = R$ 90 milhões/ano 

Redução de Custo de Churn: 1% x 60 = R$ 9 milhões/ano 

Benefício total Cenário 1: 3,6+9 = R$ 12,6 milhões/ano  

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Com a composição dos benefícios de curto e longo prazo, ainda no cenário 3 (bastante conservador), os resultados de aplicar a produtividade em prol da melhoria do OTIF superam os benefícios da aplicação da redução de custos. 

Evidentemente que neste exemplo e outros similares, algumas premissas são assumidas e cenários com análises de sensibilidade são feitos. Ainda assim, são caminhos que na prática tendem a funcionar melhor do que cálculos mais precisos, porém que demandam mais tempo, são mais difíceis de explicar aos stakeholders e, eventualmente, necessitam de um refinamento de dados não disponível na maioria das empresas. 

Por fim, uma prática que se aplica muito bem aqui é testar a melhoria em Produto Mínimo Viável (MVPs). Resultados de MVPs tendem a simplificar ainda mais os cálculos e premissas e, ao mesmo tempo, dar mais segurança nas projeções de resultados. 

No exemplo anterior, ao rodar alguns MVPs, isso possivelmente sugere que o aumento de 10% na agilidade de algumas equipes resulta em um aumento “testado” médio de 6% no OTIF dos MVPs testados. 

É possível direcionar os benefícios de diversos projetos para redução de custos ou melhoria do nível de serviço. Embora a prática comum seja aplicá-los na redução de custos, sugerimos que seja considerada (e preferencialmente testada) a melhoria em ambos os aspectos antes de tomar uma decisão final. Simulações e experiências anteriores de projeto demonstram que investir na melhoria do nível de serviço pode resultar em resultados surpreendentes e altamente benéficos. 

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