Publicado originalmente em Gestão RH
Vivemos um tempo curioso no mundo da gestão de pessoas. As manchetes pipocam com temas que parecem moldar o futuro do trabalho: semana de quatro dias, trabalho remoto ou presencial, demissões silenciosas, novas gerações que não querem liderar ou com ritmos diferentes de vida e entrega, diversidade ameaçada por mudanças políticas. Mas no meio desse ruído todo — e aqui tomo emprestado o termo de Daniel Kahneman, psicólogo, economista e Prêmio Nobel de Ciências Econômicas em 2002 —, o que é, de fato, uma tendência estrutural e o que é barulho?
O primeiro ponto é entender por que o RH é terreno tão fértil para essas ondas. Talvez porque todas as empresas sejam, no fim das contas, feitas de gente. Ou porque todo mundo tem alguma experiência de trabalho e, portanto, sente-se autorizado a opinar sobre a gestão de pessoas de sua ou de qualquer organização, mesmo sem ter se aprofundado no tema, ou ainda porque muitos dos temas ainda esteja, de fato, em desenvolvimento. Mas preciso falar a vocês: gestão de gente é técnica. É uma decisão com impacto direto no presente e no futuro do negócio. E nós, profissionais de RH, temos a responsabilidade de filtrar o ruído e entregar valor real.
Vamos aos exemplos: o debate sobre o modelo de trabalho — remoto, híbrido ou presencial — tornou-se uma arena de argumentos passionais, muitas vezes desconectados da realidade do negócio. A verdade é que não existe solução única. A resposta ideal depende da estratégia da empresa, da cultura organizacional e, claro, dos resultados que se quer atingir. A função do RH não é tomar partido entre extremos, mas apoiar líderes e times a encontrarem a configuração que melhor combina produtividade, pertencimento e propósito para a sua organização em seu devido contexto.
Outro tema que tem gerado mais barulho do que resultado prático é o da diversidade e inclusão. Importante? Essencial. Mas temos visto o assunto ser sequestrado por polarizações políticas ou tratado como um checkbox de reputação. O que deveria ser genuíno — refletir a pluralidade da sociedade dentro das empresas e proporcionar cada vez maior equidade e evolução a nossa sociedade — virou, em alguns casos, um campo de tensão. E a pergunta que fica é: estamos fazendo inclusão real ou apenas promovendo ações cosméticas?
Expressões como quiet quitting ou a geração que não quer liderar também ganharam espaço nas rodas de conversa. São conceitos interessantes para reflexão, mas que correm o risco de simplificar fenômenos complexos. O desengajamento silencioso, por exemplo, pode ser mais um sintoma de culturas organizacionais adoecidas do que uma falha geracional. E o desinteresse pela liderança talvez fale menos sobre preguiça e mais sobre modelos de liderança ultrapassados, que impõem sobrecarga sem razão. O RH precisa ir além do diagnóstico e atuar na transformação.
Em vez de perseguir modismos, é hora de nos voltarmos ao que realmente importa: sermos úteis. Sermos protagonistas na construção de organizações que entregam resultado e cuidam de gente. Isso passa por retomar o que de fato é tendência — e que exige ação prática, não só discurso.
O Gartner publicou seu relatório anual com as principais tendências de RH para 2025. Aqui trago um olhar para essas tendências em profundidade e com pragmatismo de como podemos agir:
- Gestão de mudança como competência crítica – Em vez de implantar uma “metodologia de change” para parecer moderno, é hora de treinar líderes para conduzirem pessoas em tempos de ambiguidade. Isso se faz de forma estruturada com grades de treinamentos programadas e no dia a dia, com conversas difíceis, alinhamentos constantes e coragem para ajustar a rota.
- Trabalho sustentável – Mais do que programas de bem-estar, trata-se de redesenhar o trabalho para que ele seja viável no longo prazo. Carga de trabalho justa, reconhecimento real e pausas possíveis. Isso é sustentabilidade.
- Desenvolvimento contínuo com foco em habilidades do futuro – Sair do genérico. Investir tempo em entender as skills que realmente moverão o negócio nos próximos anos e preparar as pessoas para isso. Customização é a chave, e precisa ser medida em avaliações de desempenho semestrais ou anuais.
- Uso inteligente de IA no RH – Não é sobre substituir pessoas, mas potencializar decisões. Usar dados para prever riscos de rotatividade, personalizar jornadas de desenvolvimento e tornar o RH mais analítico e menos operacional.
- Cultura organizacional adaptativa – O que sustenta uma cultura não são os valores escritos na parede, mas os comportamentos que são premiados ou tolerados. Como RH, temos o papel de ajustar os incentivos e dar feedbacks reais que moldam essa cultura todos os dias. Seu sistema de incentivos conversa com seus valores organizacionais?
Ser RH em 2025 é parar de correr atrás do hype e assumir a responsabilidade sobre o que realmente transforma uma organização. Somos mais do que designers de processos. Somos construtores do futuro. E o futuro exige clareza, coragem e senso de utilidade. O resto… é barulho.